espaço-projeto


mais uno +1 é um estúdio aberto nas Largo Residências que explora a relação entre

  um espaço
+ Largo do Intendente
+ artista do mês
+ comunidade
+ tu



—  duração do projeto
    2021 - 2022

—  local do projeto
    Largo do Intendente (Lisboa)

—  curadoria
    Angela Fellowes
    Inês Nêves

—  entidades parceiras
    LARGO Residências

—  artistas
    Angela Fellowes (Nov 2021)
    Lígia Fernandes (Jan 2022)
    Nicole Sánchez (Fev 2022)
    mais uno +1 (Mar 2022)
O projeto mais uno +1 contempla a definição e gestão de um espaço de exposição partindo da interpretação do exercício curatorial como:
  1. Ato compartilhado que se gera ou é executado por mais de uma pessoa, uma forma de testar hipóteses de relações;
  2. Ato artístico que estabelece um meio de exploração e de criação de práticas colectivas;
  3. Ato de espontaneidade premeditada, que prepara e facilita as condições necessárias à ocorrência de encontros e acontecimentos orgânicos através da expressão artística.

A partir desta perspectiva, a construção do racionalidentidadecomunicaçãooperação do espaço torna-se num ato artístico de criação comum que funciona como um território de reunião e mediação. Para que estas premissas sejam exequíveis, o espaço de exposição adopta a natureza de espaço-projeto. Num espaço-projeto a prática artística é orientada ao processo: comentada, apresentada, considerada, experimentada e co-produzida, procurando formatos colaborativos e/ou participativos e interdisciplinares.

Com ênfase no processo de exploração das diferentes dinâmicas e energias dos atores envolvidos, e considerando que o coletivo composto por únicos (1+1+1+1+…), que por si só é uno também, o espaço-projeto mais uno +1 opera em numa escala relacional e incremental que busca ativar o seu potencial de restauração social e urbana e revitalização artística local um vínculo de cada vez.

(espaço-projeto) = mais uno
mais uno + 1 (ator* A) = uno
mais uno + 1 + 1 (ator* B) = uno
mais uno + 1 + 1 + 1 (ator* C) = uno


* Alguém/algo capaz de causar efeito que pode ser
composto por um ou mais. Exemplos: vizinhos, artistas
residentes, trabalhadores da instituição, estudantes, etc.

— projetos

Angela Fellowes
"A Nossa Memória"


Uma coleção de memórias do Largo do Intendente desenhadas em individuais de café.

Lígia Fernandes "avó não me contou"


A avó não me contou sobre a sua infância, sobre como foi nascer e viver em Portugal.

A avó não me contou sobre a sua vida em Angola e Moçambique, nem sobre como teve que regressar.

A avó não me contou que guarda a fotografia do seu primeiro amor no álbum, mas não a mostra a ninguém.

A avó não me contou que fugiu da guerra com o dinheiro que conseguiu esconder dentro da vagina.

A avó não me contou sobre o dia em que deixou de tocar piano.

A avó não me contou nada sobre como o avô se foi embora e a deixou com a minha mãe.

A avó não me contou sobre a prostituição das artistas de cabaret e revista.

A avó não me contou sobre as vítimas negras da independência das ex-Colónias

A avó não me contou que as meninas ricas não podiam ir à escola.

A avó não me contou sobre a sua viagem pelo continente africano.

A avó não me contou sobre o seu trabalho de infância.

A avó não me contou sobre a sua carreira de cançonetista e artista da rádio

A avó não me contou sobre as amantes do avô.

A avó não me contou sobre o trisavô, que era de São Tomé e Príncipe e poderia ter sido traficante de escravos.

A avó não me contou sobre a sua paixão impossível por um homem de outra classe social.

A avó não me contou sobre o bisavô, que era músico de jazz e que só conheceu enquanto este dormia.

A avó não me contou porque mandou a mãe para o colégio interno.

A avó não me contou sobre o 25 de Abril.

A avó não me contou sobre a sua infância no teatro Tivoli.

A avó não me contou sobre esta Lisboa que é feita de tantas camadas.

A avó não me contou que eu fui a primeira mulher da família a nascer em Liberdade.

Isso descobri eu, depois de a ouvir.


Texto: Lígia Fernandes, baseado em depoimentos reais recolhidos com as utentes do centro de dia da N. Sra. dos Anjos entre Maio e Setembro de 2020.

Desde março de 2020 com o despoletar da pandemia de COVID-19, foram encerrados em Portugal a maioria dos espaços comunitários — entre eles o do centro de dia da Nossa Senhora dos Anjos, em Lisboa. Para muitos dos seus utentes as atividades do centro de dia eram os únicos momentos de interação social do seu quotidiano. A pandemia revelou-se especialmente difícil para a geração mais idosa, que se viu confinada em casa, em situações de solidão extrema. Foi neste contexto que recebi um convite urgente do LARGO Residências para desenvolver uma iniciativa artística com os utentes do centro de dia da N. Sra. do a Anjos.

O projeto “retratos de família” fez parte dessa iniciativa. Foi o primeiro que realizei depois da ocorrência da pandemia. Foram várias semanas de recolha das imagens e histórias de vida das diferentes utentes. A recolha consistia em visitas às suas casas e a uma conversa que decorria ao ritmo da viragem das páginas dos seus álbuns de família. Estórias de vida com muitas pausas e recomeços.

Desta iniciativa nasce o projeto a "avó não me contou": uma recolha-em-progresso das histórias e imagens de vida da geração mais antiga de mulheres em diferentes partes do mundo. Re-construo, através do desenho, uma narrativa feminina da história que ficou por escrever. Em Janeiro de 2022, regresso às imagens recolhidas no espaço mais uno +1.




                       

Fotografia: Nicole Sánchez

Nicole Sánchez
"Estúdio do Bairro"



O mês de Fevereiro no Largo Café Estúdio e no espaço-projecto mais uno +1 é dedicado à fotografia. O projecto "Estúdio do Bairro" de Nicole Sánchez procura capturar a essência da comunidade do Intendente ao reavivar uma tradição que — com o passar do tempo, o aparecimento dos fotomatons, das máquinas digitais compactas e dos smartphones — se tornou extinta.

Os estúdios fotográficos de rua representaram durante décadas um lugar de celebração, de reunião, de ritual, onde pessoas, amigos e famílias se juntavam em ocasiões especiais (e não só), enfeitando-se com o seu vestido mais bonito ou mais brilhantina no cabelo do que era habitual. Ao mesmo tempo, estes estúdios tornavam-se também um local de arquivo: nas suas montras agregavam-se os rostos aperaltados da vizinhança, as fotografias de passe, os retratos de família, ou as imagens do bebé que acabava de nascer. Via-se espelhado cada rosto que construía esse bairro, essa comunidade, essa família extensa.

Ao reconstruir no espaço-projecto mais uno +1 este “estúdio do bairro”, Nicole procura confortar a nostalgia por um lugar de encontro consumido pelo tempo. Durante um mês, os vizinhos poderão de novo colocar a sua melhor gravata, usar o seu verniz mais brilhante, e unirem-se para uma foto. Uma foto que podem levar para casa, emoldurar, e colocar na parede da sala, para relembrar que, afinal, pertencem a algo mais uno. Como uma montra, o Largo Café Estúdio apresenta os resultados do "Estúdio de Bairro" que foi montado em Dezembro de 2021.


Fotografia: Nicole Sánchez


Fotografia: Inês Gil Silva (Sounds Like a Plan Photography)



mais uno +1
"Domingos de Criação"



Em plena ditadura militar no Brasil — e três anos antes do seu fim em Portugal — aconteceram em 1971, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, os “Domingos de Criação”. Pela iniciativa de Frederico Morais, e pela ação e imaginação das centenas de pessoas que se foram reunindo, a cada domingo sucedeu-se um acto de criação, diálogo e celebração colectiva. Esta acção assumiu-se como um verdadeiro rasgo político numa altura em que a liberdade não era uma possibilidade.

Em Março de 2022, no Largo do Intendente, em Lisboa, relembrámos os “Domingos de Criação” no Largo Café Estúdio. Como parte da Cooperativa Cultural LARGO Residências, também aqui foram acontecendo muitos Domingos dedicados à cultura e à arte. Ao longo dos últimos 10 anos, o Café tem pulsado neste LARGO como centro de encontro e diálogo do Bairro Intendente.

Nestas últimas acções do Largo Café Estúdio no Largo do Intendente, convidámos a sua comunidade a criar connosco. Cada Domingo desse mês foi dedicado a uma forma de expressão — palavras, imagens, linhas, movimentos — em homenagem a todas as pessoas, artistas e trocas que por aqui passaram, e os diversos tipos de linguagem utilizados. Assim convidámos todos a despedirem-se do Café Estúdio, agradecer-lhe e dizerem que lhe pertencem, que vive em nós e continuará a perdurar no tempo. 

Em simultâneo, no adjacente mais uno +1, acumulámos os afectos e expressões trocados ao longo destes Domingos num projecto de fanzine.  A fanzine tornou-se um ateliê aberto, um projecto artístico, um processo participativo e uma exposição arquivo, onde as palavras ditas, as imagens capturadas, as linhas desenhadas e os movimentos realizados foram unidos e imortalizados em cada das suas páginas.

Fotografia: Nicole Sánchez, LARGO Residências, e Zé Luís C.



baseadxs em Lisboa, Portugal
PTEN